Lúcia Gaspar Bibliotecária da Fundação Joaquim Nabuco
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Como ocorreu em outros estados brasileiros, o futebol em Pernambuco também foi introduzido por um brasileiro que estudou na Europa, no caso o pernambucano Guilherme de Aquino Fonseca.
Filho de João de Aquino Fonseca e Maria Eugênia Regadas de Aquino Fonseca, Guilherme foi estudar na Inglaterra, aos 13 anos de idade, no Hooton Lown Schoool, onde aprendeu a técnica do jogo. Em 1903, ao voltar para o Recife e fascinado pelo esporte, resolveu fundar um clube onde se praticasse o futebol, o criquet, o rugby e o tênis. Trouxe da Inglaterra o material e os apetrechos necessários para a prática desses esportes, porém teve que enfrentar muitas dificuldades.
Na época, já existiam dois clubes esportivos na cidade, o Internacional e o Náutico. Nenhum dos dois, no entanto, oferecia atividades para uma vida esportiva atuante. O Internacional, originário de um clube de regatas, limitava-se a realização de bailes e jogos de carta. O Náutico, por sua vez, fundado no dia 7 de abril de 1901 e dedicado exclusivamente a esportes aquáticos, como o remo, praticamente não tinha competições por falta de concorrentes.
Guilherme fez várias tentativas com os dirigentes do Náutico para que o clube aderisse ao futebol, mas havia um grupo contrário que afirmava não ser o futebol um esporte, mas sim uma troca de pontapés. Ele recorreu, então, aos funcionários da firma inglesa Great Western, que costumavam jogar bola nos finais de semana em suas casas, conseguindo realizar alguns jogos, em campos improvisados no bairro do Derby.
Em 1904, reunindo onze jogadores, ele conseguiu disputar uma partida experimental contra o time da Great Western. No dia 13 de maio do ano seguinte, fundou oficialmente o Sport Club Recife.
No dia 22 de junho de 1905, foi realizado o primeiro jogo de futebol em Pernambuco, entre o Sport Club Recife e o English Eleven, time formado por funcionários das companhias inglesas sediadas no Recife. O encontro foi realizado na campina do Derby, local onde hoje está situado o campo de futebol da Polícia Militar de Pernambuco. Apesar dos prognósticos de favoritismo dos ingleses, o Sport conseguiu um empate de 2x2, cujo feito foi exaltado depois por toda a imprensa da época.
O Jornal do Recife publicou um comentário sobre a partida, que pode ser considerado como a primeira crônica esportiva escrita na imprensa pernambucana:
A prometedora associação Sport Club Recife realizou, ontem, no Dérbi, um match a epigrafar estas linhas. Eram cinco horas da tarde quando começou a diversão, notando-se no local grande número de famílias. Desde o começo o match se notou logo serem os jogadores quer do Sport, quer do English Eleven da mesma força, começando o jogo pelo ataque dos do primeiro grupo aos do segundo, muito bem defendido pelos goal-keepers e pelos backers. Notamos a falta de destreza por parte dos combatentes, sendo o resultado do match empate a decidir-se na futura pugna. Entre os do Sport distinguiram-se Amorim Colander e Torquato Gonçalves, que fez esplêndido jogo de cabeça e entre os do English Eleven tornaram-se salientes Bradford e Mielar. Damos nossos parabéns ao futuroso clube, desejando que no próximo jogo encontre melhores condições e não como ontem, cheio de lama, o que prejudicou a bela diversão. Durante a festa tocou uma banda de música da Polícia.
Nos primeiros dez anos de futebol em Pernambuco, a imprensa descrevia os jogos chamando os jogadores de “senhor” ou “doutor”, utilizando várias palavras em inglês, a exemplo de team, goal, goal-keeper, match, referee, foul, center-forward, dribling, corner, off-side, penalty, full-back. Algumas dessas palavras foram deturpadas criando corruptelas como quipa, centrefó, dribe, córne, outras foram incorporadas ao vocabulário do futebol no Brasil como off-side e penalty.
O segundo jogo entre o Náutico e Sport, que terminou em 0x0, realizado em agosto de 1909, foi assim descrito em notícia publicada no Jornal Pequeno:
Há muito que não temos um match tão ansiosamente esperado e com tamanha concorrência, como o de ontem no ground de Santana, disputado pelos simpatizados clubs Sport Club e Náutico Capibaribe, entre teams brasileiros. [...] Às 4 e 25 ouviu-se o apito do referee, Sr. Tonkinson, para o início do match. O kick-off foi dado pelo forward do team do Sport, tomando a bola logo a direção do goal do Náutico onde se conservou todo o tempo. [...] Gostamos imenso das bonitas shootadas dos valentes full-backs Manoel Guimarães Júnior e José Maia. Distinguiram-se pelos driblings e passes os srs, Américo Silva, Alberto Amorim, Horácio B. da Cunha e João do Amorim Júnior. [...] Damos os parabéns as duas sociedades pelo êxito do match.
Depois de 1911, começaram a surgir times de futebol por diversos subúrbios recifenses e, em 1914, não havia apenas o Sport, o Náutico e a Tramways, time de ingleses, mantido pela Pernambuco Tramways, uma companhia de energia elétrica que deu origem à Companhia de Eletricidade de Pernambuco, Celpe. Foram fundados, entre outros, o Santa Cruz Futebol Clube, o Paulistano, o Internacional, o Centro Esportivo do Peres, a Coligação Recifense, o Agros Esporte Clube, constituído por estudantes da Escola de Agronomia de Socorro, logo substituído pelo Torre Esporte Clube, o Caxangá, o Esporte Clube Flamengo, o Casa Forte, o Olinda, o João de Barros (origem do América), o Velox, o Americano, o Pernambuco entre muitos outros.
Em 16 de junho de 1915, foi criada a Liga Sportiva Pernambucana (LSP), atual Federação Pernambucana de Futebol (FPF), que promoveu o primeiro campeonato pernambucano, realizado a partir de agosto do mesmo ano, com a participação das seguintes agremiações: Santa Cruz, Torre, América, Centro Esportivo do Peres e Coligação Esportiva Recifense. O certame foi vencido pelo invicto Flamengo Esporte Clube, ao derrotar o time do Torre por 3x1.
O segundo campeonato foi realizado no ano seguinte, 1916, com a participação de mais quatro times, o Clube Náutico Capibaribe, o Sport Club Recife, o Paulista e o Casa Forte. O campeão foi o Sport, que também conseguiu o campeonato em 1917. O Santa Cruz conseguiu seu primeiro campeonato, em 1931 e o Náutico, em 1934.
Até essa época, os jogos de futebol eram realizados na campina do Derby. A partir de 1916, os jogos passaram a ser disputados no campo do Britsh Club, situado na Ponte d’Uchoa, que tinha a sua sede no local onde funciona hoje o Museu do Estado, na Av. Rui Barbosa. Em 1917, a LSP inaugurou seu campo oficial, localizado no bairro dos Aflitos, hoje pertencente ao Clube Náutico Capibaribe, o Eládio de Barros Carvalho.
Em 1919, o Sport inaugurou seu estádio na Avenida Malaquias, que era considerado o melhor da época. Havia ainda o campo do América, o América Parque, localizado no bairro da Jaqueira.
Em 1928, foi inaugurado também o estádio do ABC, em Apipucos, que ficou conhecido como Bebinho Salgado.
O estádio da Ilha do Retiro, também pertencente ao Sport, foi inaugurado em 1937, e, em 1966, o José do Rego Maciel, conhecido como o Colosso do Arruda, com capacidade para 60 mil pessoas, de propriedade do Santa Cruz Futebol Clube.
Atualmente, existem diversos estádios em cidades do interior de Pernambuco, como o Gigante do Agreste Meridional e o Gerson Emery, em Garanhuns; o Severino Cândido Carneiro, em Vitória de Santo Antão; o Pedro Victor/Luis Lacerda e o Antonio Inácio de Souza, ambos em Caruaru; o Manoel A. da Mota (Galegão), em Petrolândia; o Otávio Limeira Alves, em Santa Cruz do Capibaribe; o Cornélio de Barros, em Salgueiro; o Nildo Pereira (Pereirão), em Serra Talhada; o Souto Maior, em Arcoverde; o da Associação Rural, de Petrolina; o Vila Olímpica do SESC, em Belo Jardim; o Gaudenção, em Itacuruba; o Carlos Alberto Oliveira, em Surubim; o José Vareda, em Limoeiro; o Gileno de Carli, no Cabo de Santo Agostinho; o Jéferson de Freitas, em Jaboatão dos Guararapes; o Ferreira Lima, em Timbaúba; o Carlos Santana, em Ipojuca; o Agamenon Magalhães, em Goiana; o Estádio Municipal, em Nossa Senhora do Ó.
No período de 1919 a 1981, o futebol pernambucano realizava o Torneio Início, que abria oficialmente o campeonato. O Sport foi o time que obteve o maior número de troféus na competição, conquistando dezoito, seguido do Náutico, com quatorze, do Santa Cruz com doze e do América com onze. Também conseguiram ser campeões do Torneio Início, o Íbis, conhecido hoje como o pior time do mundo, em 1948 e 1950; o Auto Sport, em 1951; o Ferroviário, em 1961, e as equipes caruaruenses Central, em 1973, e Caruaru, em 1981. Apesar do interesse do público, que enchia os estádios, devido ao calendário apertado e a falta de interesse dos clubes, a Federação Pernambucana de Futebol encerrou a competição em 1981.
O primeiro jogo noturno em Pernambuco foi realizado no dia 13 de maio de 1928, no campo do Ambolê, pertencente ao Varzeano Futebol Clube, localizado no bairro da Várzea, na comemoração dos seus onze anos de fundação. Foram instalados quatro postes de madeira com refletores possantes, dois de cada lado do campo, e uma rede com diversas lâmpadas ao redor do gramado. O mesmo sistema – planejado e executado pela empresa George Kirilos e Cia. – foi posteriormente implantado no campo da Avenida Malaquias e no do ABC, em Apipucos.Nessa época, o futebol suburbano recifense teve um grande impulso, com a criação da Associação Suburbana dos Desportos Terrestres (ASDT), em 1º de fevereiro de 1929. Seus primeiros filiados foram os seguintes times: Tráfego, Aurora, Fluminense, Afogadense, Arruda Diversional, Monteirense, Santo Dumont, Independência, Varzeano, Cordeirense, Rio Branco, Palmeiras, Torre, Associação Atlética do Arruda, Auto Sport, Nacional, Pina, Recife, Rio Corrente, Jutaí, Ateniense, Tuiuti, ABC, Íris, Great Western e Tejipió.
Em 28 de abril do mesmo ano, com a participação de 38 clubes, a ASDT realizou seu Torneio Início, no campo do América, cujo campeão, o Ateniense, conseguiu também conquistar o campeonato do ano, passando a ser chamado pelos torcedores de pai dos subúrbios.
Em 1930, o grande crescimento do futebol suburbano, que levava multidões aos gramados, levou os jornais a criarem uma página dedicada exclusivamente aos jogos da ASDT. Devido ao bom futebol apresentado, alguns desses times ingressaram na primeira divisão do campeonato pernambucano.
Com a eclosão da Revolução de 1930, houve grandes transtornos para o futebol pernambucano, principalmente, em outubro, com a deposição do governador Estácio Coimbra. O campeonato não terminou, sendo o Torre declarado campeão, uma vez que estava na frente da competição.
De 1930 a 1939, foi implantado o futebol profissional no Brasil. O primeiro jogador a assinar um contrato, em Pernambuco, foi Luiz Gago, com o Central de Caruaru, no ano de 1937.
A partir de 1940, o futebol pernambucano começou a ficar conhecido no cenário nacional. Dois motivos contribuíram para isso: a quantidade de bons jogadores “exportados” para clubes das regiões Sul e Sudeste e uma excursão realizada pelo Sport Clube do Recife aos Estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul, no final de 1941 e início de 1942, quando fez uma brilhante campanha, conseguindo derrotar grandes equipes sulistas como Flamengo, Vasco da Gama, Atlético Mineiro, Coritiba, Internacional e Grêmio.
Pernambuco teve a honra de sediar uma partida válida pela Copa do Mundo de 1950, entre as seleções do Chile x Estados Unidos, que foi realizada na Ilha do Retiro e vencida pelo Chile por 5x2. O primeiro ídolo do futebol pernambucano foi Pitota (Alcindo Wanderley), recordista de gols nos campeonatos de 1917 e 1919 – que foi jogador do Tamoio Futebol Clube, de Olinda e depois do Santa Cruz. O principal artilheiro é o capixaba Baiano, que atingiu a marca de 118 gols em três temporadas (campeonatos de 1981 -1983), sendo também o recordista com quarenta tentos por competição e o maior goleador em jogos oficiais, por temporada, no Brasil, obtendo, em 1982 e 1983, o troféu Chuteira de Ouro, oferecido pela Adidas. Outro grande artilheiro foi Tará (Humberto Viana), atacante que durante dez anos foi jogador do Santa Cruz, atuando também pelo Náutico (1943-1947), conseguindo marcar nove gols em uma mesma partida, recorde só quebrado, em 1976, por outro pernambucano, Dario Peito de Aço, que conseguiu a proeza de fazer dez tentos em um mesmo jogo.
Pernambuco sempre contribuiu com craques para o futebol nacional, revelando vários representantes, que atuaram na seleção brasileira em Copas do Mundo: Ademir Menezes (Ademir Marques de Menezes, o “Queixadá”), na Copa de 1950, o primeiro brasileiro artilheiro em Copas do Mundo, com nove gols; Vavá (Edvaldo Izídio Neto) conhecido como “peito de aço” (Copas de 1958 e 1962); Zequinha (José Ferreira Franco, Mundial de 1962); Rildo (da Costa Menezes), que jogou o mundial de 1966, na Inglaterra; o goleiro Manga (Hailton Correa de Arruda, Copa de 1966); Ricardo Rocha (Mundiais de 1990 e 1994); Rivaldo (Vitor Borba Ferreira, Copas de 1998 e 2002), eleito o melhor jogador do mundo em 1999 e o segundo melhor do Mundial de 2002; Juninho Pernambucano (Antonio Augusto Ribeiro Reis Júnior, Copa de 2006) e Josué (Anunciado de Oliveira), nascido em Vitória de Santo Antão, que participou da Copa do Mundo de 2010, na África do Sul.
A partir da década de 1990, houve um grande avanço na interiorização do futebol pernambucano, conduzido pela Federação Pernambucana de Futebol, criando oportunidades para que cidades como Caruaru, Garanhuns, Serra Talhada, Petrolina, Arcoverde, Salgueiro, Santa Cruz do Capibaribe, Vitória de Santo Antão, entre outras, tivessem representantes na competição oficial.
A equipe do Salgueiro, agora em 2010, conseguiu uma grande vitória: ascender da série C para a série B do Campeonato Brasileiro de Futebol.
Do início dos campeonatos de futebol em Pernambuco, em 1915 até 2010, o Sport Clube do Recife foi o time que conquistou o maior número de campeonatos pernambucanos, com 39 títulos (o primeiro em 1916), seguido do Santa Cruz, com 24 (o primeiro em 1931) e do Náutico, que conseguiu 21 títulos, sendo o primeiro no ano de 1934.
O Santa Cruz Futebol Clube é o único que participou de todos os campeonatos (1915 a 2010) e o Clube Náutico Capibaribe, o que detém atualmente o único título de hexacampeão pernambucano (1963 a 1968).
Foram ainda campeões, o Flamengo Esporte Clube, em 1915, o América Futebol Clube, com seis títulos e o Tamways Sport Club, equipe formada por funcionários da empresa inglesa Pernambuco Tramways and Power Company Limited, responsável, na época, pelos serviços de bonde e energia elétrica no Recife, com dois títulos.
Abaixo, os times campeões pernambucanos de 1915 a 2010, com os anos em que conseguiram o título:
Flamengo Esporte Clube – 1915.
Sport Club do Recife – 1916-1917, 1920, 1923-1925, 1928, 1938, 1941-1943, 1948-1949, 1953, 1955-1956, 1958, 1961-1962, 1975, 1977, 1980-1982, 1988, 1991-1992, 1994, 1996-2000 (pentacampeão), 2003, 2006-2010 (pentacampeão).
América Futebol Clube – 1918-1919, 1921-1922, 1927, 1944.
Torre Futebol Clube – 1926, 1929-1930.
Santa Cruz Futebol Clube – 1931-1933, 1935, 1940, 1946-1947, 1957, 1959, 1969-1973 (pentacampeão), 1976, 1978-1979, 1983, 1986-1987, 1990, 1993, 1995, 2005.
Clube Náutico Capibaribe – 1934, 1939, 1945, 1950-1952, 1954, 1960, 1963-1968 (hexacampeão), 1974, 1984-1985, 1989, 2001-2002, 2004.
Tramways Sport Club – 1936-1937.
Recife, 17 de novembro de 2010.
FONTES CONSULTADAS:
ALVES, Givanildo. História do futebol pernambucano (1903/1950). Recife: Governo de Pernambuco, Secretaria de Educação e Cultura, 1978.
CARVALHO, Lucas. Pernambucanos na Copa. Disponível em: <http://blogfutebolpe.blogspot.com/2010/04/pernambucanos-na-copa.html>. Acesso em: 9 nov. 2010.
ENCICLIOPÉDIA DOS CAMPEONATOS PERNAMBUCANOS DE FUTEBOL. Recife: Folha da Manhã, 1955.
FERREIRA, José Maria. História dos campeonatos: memória do futebol pernambucano (1915 a 2007). Recife: CEPE, 2007.
A HISTÓRIA ilustrada do futebol brasileiro. [S.l.]: Edobras, [1968?]. v. 2.S
COMO CITAR ESTE TEXTO:
GASPAR, Lúcia. Futebol em Pernambuco. Pesquisa Escolar Online, Fundação Joaquim Nabuco, Recife. Disponível em: <http://basilio.fundaj.gov.br/pesquisaescolar/>. Acesso em: dia mês ano. Ex: 6 ago. 2009.
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