Júlia Alves Barbosa |
Semira Adler Vainsencher Pesquisadora da Fundação Joaquim Nabuco
Inseridas nesse contexto, portanto, até a segunda década do século passado, as brasileiras não tinham o direito de votar e/ou de ser votadas. Estavam em vigência as relações oligárquicas da República Velha, na qual predominava o poder único e exclusivo dos homens. As mulheres norte-rio-grandenses não se encontravam inseridas, totalmente, no processo de lutas pela igualdade de direitos entre homens e mulheres, mas, também, não estavam alijadas desse processo. As relações de gênero só começaram a mudar quando algumas potiguares conquistaram os direitos políticos e cidadãos: o direito de votar e de ser votada para cargos públicos eletivos.
Há que se admitir que, no Rio Grande do Norte, o relevante ganho político conferido às mulheres resultou das reivindicações feministas, por igualdade de direitos, lideradas pela bióloga paulista Bertha Lutz (1894 -1976). Bertha foi uma das lideranças feministas mais expressivas na campanha pelo voto das mulheres, como também pela igualdade de direitos entre mulheres e homens, tendo esse processo reivindicatório incentivado e acirrado lutas, em várias partes do Brasil. Através de entidades de apoio à causa do sufrágio feminino, as mulheres partiram para a luta. Uma dessas entidades foi a Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, cuja Presidente - Bertha Lutz - buscava deputados federais que apoiassem a criação de um projeto de lei dando vez ao voto das mulheres.
Em 1926, quando a Constituição brasileira foi revisada, os legisladores não incluíram uma disposição consagrando, explicitamente, a igualdade de direitos para ambos os sexos. Tal falha gerou protestos do então senador Juvenal Lamartine, um candidato ao Governo que defendia a inclusão dos direitos e deveres cívicos para homens e mulheres. Neste sentido, foi feita a seguinte emenda no Artigo 77, das Disposições Gerais:
No dia 25 de outubro de 1927, passou a vigorar a Lei Estadual nº 660, com a emenda Regular o Serviço Eleitoral do Estado, que estabelecia a não distinção de sexo para o exercício do sufrágio e, tampouco, como condição básica de elegibilidade. Assim, em 25 de novembro de 1927, Celina Guimarães Viana deu entrada em uma petição, mediante a qual requeria sua inclusão na lista de eleitores. Ao receber do juiz um parecer rápido e favorável, fez um apelo ao presidente do Senado Federal para que todas as mulheres tivessem o mesmo direito. Em seu telegrama, lia-se:
É importante lembrar que Celina Guimarães Viana, natural de Mossoró, não foi a primeira mulher a requerer inclusão no alistamento eleitoral. Em verdade, tal pioneirismo coube à professora Júlia Alves Barbosa, nascida em Natal, em 24 de novembro de 1927. Entretanto, na época, dada à sua condição de solteira, o juiz da 1ª vara da Capital retardou o deferimento do pleito de Júlia, e este só saiu publicado, no Diário Oficial do Estado, no dia 1º de dezembro do mesmo ano. Por outro lado, o despacho de Celina foi rapidamente aprovado, pelo fato de ser casada com um advogado e professor. Logo, por ser esposa de alguém importante, Celina se tornou a primeira eleitora não apenas do Rio Grande do Norte e do Brasil, porém, de toda a América Latina. E Júlia Alves Barbosa ficou sendo a segunda eleitora. Seja como for, pode-se observar como o movimento sufragista potiguar era atuante, na época.
Com a promulgação da Lei Estadual n. 660, explicitando os direitos políticos e civis das mulheres e, em particular, o direito ao voto, Celina passou a conscientizar as mulheres acerca da importância de se votar; e, somente na década seguinte, aquela Lei foi ampliada para os demais Estados da Federação. Em pouco tempo, a notícia corria o mundo, sendo aclamada em vários jornais feministas. Para poder votar, é importante frisar, as mulheres precisavam ter mais de 21 anos, não ser analfabetas, ter uma profissão que garantisse renda, não viver de mendicância, e tampouco ser religiosas com voto de obediência.
Júlia Alves Barbosa Cavalcanti nasceu em 1898, em Natal/RN. Era uma líder nata, educadora e catedrática da Escola Normal de Natal, pioneira em movimentos pela emancipação da mulher, e engajada em lutas contra os preconceitos. Diplomada professora, ela foi a primeira mulher a ensinar matemática na Escola Normal do Estado, tendo entrado por meio de concurso.
Júlia poderia ter sido a primeira eleitora do Brasil, pois requereu seu alistamento eleitoral no dia 22 de novembro de 1927, pouco menos de um mês depois de sancionada a Lei Estadual de nº 660, que consolidou a vitória dos direitos políticos da mulher norte-rio-grandense. Porém, a taça do pioneirismo ficou com Celina Guimarães Viana, nascida na cidade de Mossoró/RN, que, na época, por ser casada e contar com o apoio do marido - um advogado e professor - teve seu requerimento despachado com rapidez e publicado no Diário Oficial do Estado, antes que o de Júlia.
Cabe registrar que, em seus 45 anos de vida, Júlia Alves Barbosa Cavalcanti quebrou barreiras e enfrentou preconceitos, tendo sido uma das fundadoras da Associação de Eleitoras Norte-rio-grandenses, entidade que teve um papel pioneiro no Estado, no tocante à conscientização da mulher como cidadã. Júlia foi casada com o professor e poeta Francisco Ivo Cavalcanti. Ela faleceu em Natal, em 1943.
BUARQUE, Cristina; VAINSENCHER, Semira Adler. ONGs no Brasil: da filantropia ao feminismo. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, Cadernos de Estudos Sociais, v. 18, n. 1, jan./jun. 2005, p. 5-19.
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NASCIMENTO, Geraldo Maia do. Celina Guimarães e os 80 anos da primeira concessão do voto feminino. Disponível em: <goo.gl/DGJ7Ga>. Acesso em: 4 maio 2008.
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COMO CITAR ESTE TEXTO:
Fonte: VAINSENCHER, Semira Adler. Júlia Alves Barbosa. Pesquisa Escolar Online, Fundação Joaquim Nabuco, Recife. Disponível em: <http://basilio.fundaj.gov.br/pesquisaescolar/index.php>. Acesso em: dia mês ano. Ex: 6 ago. 2009.
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